quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Viver não doi

Viver não dói.
O que dói é a vida que não se vive.
Emílio Moura (poeta mineiro)

Li um texto do Jurandir Freire Costa e um outro de Flavio Gikovate e fiquei pensando... Meu trabalho é refletir sobre inovação e tecnologia, falar de como isto está mudando o mundo e nossas vidas... Mas, para ser honesto, acho que as transformações mais importantes deste início de século são as transformações que estamos vivenciando nas relações humanas.
Gikovate nos alerta que o romantismo do século passado nos levou a procurar no outro o complemento indispensável para nossa felicidade: “O amor romântico parte da premissa de que somos uma fração e precisamos encontrar nossa outra metade para nos sentirmos completos. Muitas vezes ocorre até um processo de despersonalização que, historicamente, tem atingido mais a mulher. Ela abandona suas características, para se amalgamar ao projeto masculino”. Completa dizendo que uma outra teoria, no fundo com esta mesma base, é de que devemos procurar nossos opostos, para assim chegar ao equilíbrio. Se sou calmo, devo procurar alguém agressivo, se sou sonhador, uma pessoa pragmática...
Com base na sua vasta experiência como psicoterapeuta, Gikovate aponta que “o que se busca hoje é uma relação compatível com os tempos modernos, na qual exista individualidade, respeito, alegria e prazer de estar junto, e não mais uma relação de dependência, em que um responsabiliza o outro pelo seu bem-estar... As pessoas estão aprendendo a conviver melhor consigo mesmas. Elas estão começando a perceber que se sentem fração, mas são inteiras” (grifo meu).
Freqüentemente identificamos a causa de nossos problemas nos outros: fulano é insensível, beltrano me irrita, ninguém percebe meu valor... Identificamos os problemas, e conseqüentemente, as soluções como estando fora de nós. Em poucas palavras, como diria Sartre, “O inferno são os outros”...
Jurandir Freire e Gikovate propõem um outro caminho. Ao invés de culpar o outro ou, no caso das relações afetivas, buscar nossa “alma gêmea” ou "a parte que nos falta", eles nos sugerem buscarmos a plenitude. Não devemos nos contentar em sermos frações, mas seres inteiros naquilo que fazemos. E para isso, quanto mais competente formos para viver sozinhos, mais estaremos preparados para viver intensamente uma relação afetiva. A relação não será doentia (“não posso viver sem você”), mas saudável, sem exigências, onde ambos podem crescer.
Claro que este é o caminho mais difícil. Certamente é muito mais fácil adotar um perfil conhecido, imitando os modelos que todos os dias as novelas e filmes de holywood nos propõem. Quando você copia os outros há menos riscos. Quando não copiamos ninguém... estamos sozinhos!
É uma opção de maior risco, mas muito mais interessante!!! Afinal, como nos ensina o poeta, viver não dói. O que dói é a vida que não se vive.

Um comentário:

Geneson disse...

Não acredito que li isso hoje aqui.
literalmente eu amei quem escreveu, tá certo que estou longe de entender e vivenciar tudo que foi dito no que diz repeito a não ser uma fração.

Mas é fato que estou no caminho.
Espero chegar lá.